Percentual de março é o maior desde outubro do ano passado. Inflação é o principal motivo do descontrole das finanças.
Em março, a PEIC – Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, da Fecomércio-BA, mostrou que 31,3% das famílias de Salvador possuem contas em atraso, maior percentual desde outubro do ano passado. Em termos absolutos, são 291,8 mil famílias que não pagaram a dívida até a data do vencimento, um aumento de 63 mil em relação a igual período do ano passado.
Outro dado que preocupa é a taxa de famílias que já dizem que não conseguirão pagar a dívida em atraso, de 10,9%, o nível mais alto desde dezembro de 2020. “São pouco mais de 100 mil famílias na capital baiana que estão nessa situação mais delicada”, salienta o consultor econômico da Fecomércio-BA, Guilherme Dietze.
E o endividamento, por sua vez, subiu também pelo segundo mês seguido. Em março, a taxa foi de 69% ante os 68% de fevereiro. Há um ano, o percentual era de 60,2%. Atualmente, são 644 mil famílias com algum tipo de dívida, 84,4 mil a mais do que março de 2021.
“E não há dúvida de que a inflação é a grande vilã do orçamento das famílias. O IPCA, inflação oficial, na RMS, sobe 11,33% no acumulado dos últimos 12 meses até fevereiro, taxa mais alta que a do Brasil (10,54%) e de capitais do Nordeste, como Recife (10,53%) e Fortaleza (10,25%)”, destaca o economista da Federação.
Desde o ano passado, a Fecomércio-BA vem alertando sobre o cenário que se concretizou, do descontrole da dívida. “Isso porque as famílias foram contraindo crédito, para manutenção do consumo diante da inflação elevada, porém sem a certeza de que teriam capacidade de arcar com o compromisso feito”, pontua Dietze.
A expectativa das famílias era de que a situação econômica melhorasse, com menos inflação e mais emprego. “O que se viu, no entanto, foi a chegada da ômicron e, agora, a guerra na Ucrânia, pressionando ainda mais os preços de alimentos e combustíveis, além de trazer um freio a mais para a retomada da economia”, justifica o economista.
Dietze reforça ainda que, “sem condições de pagar as dívidas e com renda limitada para o consumo diário, seria evidente este aumento da inadimplência e dos calotes temporários”.
Cartão de Crédito
O cartão de crédito tem sido a saída mais frequente para expandir o crédito. São 86,1% das famílias soteropolitanas que estão endividadas nesta modalidade, abaixo, por exemplo, do que se viu no final do ano passado com a taxa oscilando próximo a 90%. Na segunda colocação estão os carnês com 13,1%, aumentando significativamente em relação aos meses anteriores.
“Fica visível a necessidade de crédito e a troca feita pelos consumidores. Quando o limite do cartão fica restrito, as famílias buscam os carnês para manter o consumo. O crédito pessoal também tem crescido com taxa, 8,7% em março, sendo que no ano passado girava em torno de 4 a 5%”, cita o economista.
O consultor econômico esclarece também, que o grande problema, independentemente da linha de crédito, é que os juros subiram expressivamente do ano passado para cá. “A taxa básica de juros que estava em 2% ao ano está agora em 11,75%. Ou seja, o aumento dos juros além de encarecer o preço final do produto, também força a família inadimplente a pagar mais taxas e, por consequência, sobrando menos para o consumo do dia a dia, informa Dietze.
Na análise por faixa de renda, os maiores níveis de endividamento e inadimplência são das famílias com renda abaixo de 10 salários-mínimos, de 71,6% e 34,1%, respectivamente. Enquanto para as famílias de renda mais elevada, o endividamento foi de 42,4% em março, e 8,8% de famílias com contas em atraso.
E a situação deve permanecer crítica nos próximos meses. “A guerra da Ucrânia já tem gerado efeitos negativos, como foi o caso do reajuste dos preços da gasolina, óleo diesel e do gás. Segundo a ANP, o preço médio da gasolina comum na Bahia foi de 7,52 reais entre os dias 13 e 19 de março”, observa o consultor.
Além disso, o acréscimo dos preços dos fertilizantes, do trigo, soja, milho, entre outros produtos agrícolas, devem pressionar os custos no campo e, por consequência, chegará logo mais no bolso do consumidor. Até porque, o custo do transporte também encareceu.
“Diante de mais um ciclo de aumento de preços, sobretudo nos grupos que mais pesam no orçamento das famílias, alimentação e transportes, as famílias precisarão complementar a sua renda com crédito, mesmo com a taxa de desemprego na Bahia em 17,3%, ou 1,24 milhão de pessoas a procura de um emprego no estado”, considera o economista.
Portanto, com a inflação impactando a renda e o mercado de trabalho pouco aquecido, a tendência é ofertar manutenção no nível elevado da inadimplência, o que liga um alerta importante para o comércio no sentido de poucas vendas.
Foto: Noel Tavares